sexta-feira, 30 de abril de 2010

Escondendo-me N'ele

Bom, na vida, a cada dia que vivo (ou morro, não sei bem certo)tenho uma leve impressão que as dúvidas, incertezas, dificuldades, são os instrumentos mais importantes para nossa auto-descoberta e amadurecimento em relação a nossa identidade. Com base nisso, tenho feito algumas perguntas que, ora encontro respostas, ora encontro perguntas, ora não encontro nada e continuo pensando.
Um tempo atrás estava lendo e me deparei com um texto que o apóstolo Paulo escreveu a uma igreja, que me fez pensar: “Vocês foram ressuscitados com Cristo. Portanto, ponham o seu interesse nas coisas que são do céu, onde Cristo está sentado ao lado direito de Deus. Pensem nas coisas lá do alto e não nas que são aqui da terra. Porque vocês já morreram, e a vida de vocês está escondida com Cristo, que está unido com Deus. Cristo é a verdadeira vida de vocês, e, quando ele aparecer, vocês aparecerão com ele e tomarão parte na sua glória.”( Cl. 3:1-4). - Nossa que esquisito, isso me parece tão diferente do que tenho escutado e lido por ai ( pensei). Que negócio é este de por o meu interesse nas coisas do céu, pensar nas coisas do alto e não mais nas daqui, e esse negócio de que morremos com ele e nossa vida está escondida com Cristo, até que a parte da glória é bem atrativa (continuo pensando).
Começo perceber ao ler este texto, que algumas coisas em nossa igrejas caminharam pra bem distante disso. Começamos pela parte na glória D’ele e esquecemos de responder a pergunta: como escondemos nossa vida N’ele?
E isso me faz lembrar do Evangelho do Jesus de Nazaré. Um proposta de vida que troca o exterior pelo interior, a religiosidade pela espiritualidade, as necessidades pela Presença, as águas pela Fonte, o cheio pelo transbordar, a comida e a bebida pela partilha, a “terra” pelo “céu”, egoísmo por altruísmo, a força e o poder pela fraqueza da dependência do amor. Hoje não quero falar dos outros, quero falar de mim. E ai vem o Jesus me dizendo: “E, quando orardes, não sereis como os hipócritas; porque gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa. Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.(Mt. 6:4-5). Minhas convicções começaram a amadurecer, quando descobri que o que Jesus queria me dizer que existe um “quarto secreto” que é “lugar” onde eu escondo minha vida N’ele, através de uma vida de intima solitude e contemplação D’ele, oferendo meu coração quebrantado e recebendo o coração quebrantado do Abba, que começo a esconder-me para que ele se manifeste em mim. Existe alguma recompensa maior que está? “Deus em nós a esperança da Glória”


Luiz Eduardo Caraline

quinta-feira, 15 de abril de 2010

A endo-mística do Reino de Deus

“Deus me é mais íntimo que meu íntimo, mais íntimo que eu a mim mesmo.”
[Santo Agostinho, Confissões III, 6, 11]

A noção de que Deus e o seu amor se fazem presentes no meio de nós na medida em que amamos e servimos aos pobres e excluídos (cf 1Jo 4,12) é [...] o que Hugo Assmann chamou de “endo-mística”: “Deus em nós”.

A presença do Amor de Deus em nós acontece no amor solidário ao próximo. Não há uma relação de causalidade entre o que vem primeiro e o que vem depois. Nas palavras de Assmann, “Deus solidário é o Deus em todos e de todos”. A presença de Deus se faz presente em nós quando nós nos abrimos ao próximo no amor solidário, e nós somos capazes disso porque o amor de Deus opera em nós. É um “acontecimento” onde os “dois amores” ocorrem simultaneamente, que só acontece na medida em que o amor solidário pelo próximo e o amor de Deus se fazem presentes ao mesmo tempo.

Antes do amor solidário, Deus em nós está presente em nós como ausência. Para ter uma ideia do que seja a presença na forma de ausência, podemos tomar como exemplo a saudade. Nós não sentimos saudade de uma pessoa que está presente, e nem de uma pessoa de quem não sentimos a falta. Saudade nos mostra que sentimos a falta, a ausência da pessoa querida. A ausência dela está presente em nós, ou ela está presente conosco como ausência. De modo análogo, Deus está lá, mas como ausente, porque o seu amor em nós não é realizado. Como diz a primeira carta de João, “se nos amamos uns aos outros, Deus permanece em nós e o seu Amor em nós é realizado” (1João 4,12). Assim como pessoas que estão fisicamente próximas de nós só entram nas nossas vidas na medida em que nos abrimos a elas, podemos fazer analogia e dizer que Deus está no mais íntimo do nosso ser, mas se torna “Deus em nós” na medida em que nos abrimos para as angústias e alegrias das outras pessoas.

É claro que, na vida concreta, há momentos em que precisamos e devemos buscar esse “Deus em nós” na solidão e no silêncio. Mesmo nesses momentos, há uma diferença entre ir “para dentro de si” de modo solitário, sem carregar consigo os sofrimentos e angústias de outras pessoas, e a busca de “Deus em nós” no mais íntimo do nosso ser levando conosco “os rostos, olhos e sorrisos...” da nossa gente. São buscas e encontros diferentes!

Nesse sentido, o termo “nós” do “Deus em nós” não significa aqui o coletivo de indivíduos , cada um tendo seu Deus dentro de si, mas sim a relação comunitária entre sujeito-sujeito. Relação essa que se vive ao se fazer próximo do necessitado, e juntos na luta pela libertação sempre provisória e relativa, nos alegrarmos com o viver (a celebração do Deus da Vida). Assim, construindo uma sociedade mais humana e justa, sinal antecipatório do Reino de Deus, fazemos acontecer a presença do Deus em nós, o reinado de Deus que já está no meio de nós.

2010 | Jung Mo Sung


fonte: http://www.ibab.com.br/pastoral_20100411.html