Em um primeiro momento,
O silêncio é para privação,
Carência, vazio enfadonho,
Um desapegar-se das pessoas,
Das coisas e das atividades atraentes.
O silêncio é percebido
Como inútil, aborrecido,
Perda de tempo.
II
Cheio de eco, confuso, desconexo,
Ansioso das coisas deixadas para trás,
Preocupado com o que vem pela frente,
Carente de companhia e ocupação,
Exigente de distrações.
Porém, quando se ultrapassa este momento,
O silêncio se faz palavra.
Os fantasmas escondidos
Começam a sair à luz
E a gritar todas as suas exigências.
Antes trabalhavam na clandestinidade,
Mascarados e escondidos no ativismo,
Projetos e relacionamentos,
E passavam quase despercebidos.
No entanto, também a vida encorajada
Começa a brotar mais firme e sólida,
E nos surpreende a profundidade ignorada
Que surge em nós mesmos,
A partir de nossa abertura
Para o infinito Deus.
III
O silêncio, então, se transforma em luta,
Corpo a corpo com os vícios da alma,
E com os fantasmas e seus exércitos de medos,
E as novas exigências
De uma autonomia inesgotável.
O silencio é tenso,
Implacável e decisivo.
Na luta, algo em mim morre,
Algo volta a ser clandestino,
Mas também algo novo se firma.
Saio, no entanto, marcado
Pela agonia do arrependimento,
E transformado pelo Espírito.
IV
O silencio se cristaliza
Diante desta acolhedora e santa presença.
Passa-se da loucura do “cronos”
Para o descanso do “sabat”
E para a plenitude de um “kairós”
Fértil de convicções infinitas
E de vida recém-nascida.
Sereno estar em companhia
De quem me abre o espaço
De seu amor discreto e silencioso,
Onde se faz consistente minha harmonia
E minha paz da alma.
Confiante, alegre, repousante, inovador.
O silencio é palavra encarnada
É oração sem palavras.
Poema de autor desconhecido,, traduzido por Osmar Ludovico da Silva. Extraído do Livro Caminhos do coração de Ricardo Barbosa.